19/12/2011

A REGULAMENTAÇÃO DO PSICOPEDAGOGO

Nívea Maria C. de Fabrício

Presidente da ABPp fala sobre a regulamentação da profissão

Como está a regulamentação da profissão de psicopedagogo?

Está em Brasília obedecendo aos trâmites legais, sob o comando do Deputado Barbosa neto e, está na comicidade em fóruns, encontros, simpósios, ou seja, em todas as situações e momentos em que possamos refletir e trocar, sobre o papel e campo de atuação do Psicopedagogo; da Psicopedagogia. Nosso processo de regulamentação passa pela legalização e legitimação. A sociedade legitima e a lei legaliza. Na minha concepção , a Psicopedagogia é a profissão do terceiro milênio, pelo menos no próximo século, portanto, sua legitimação é mais decorrente. Já, a legalização, pelo aspecto burocrático, e pela dinâmica democrática que deve incorporar, o ritmo é diferenciado, talvez mais lento, principalmente porque estamos reivindicando alto novo no Brasil. Nosso projeto de regulamentação será de especialidade e não de graduação. Isso é inédito! O Conselho Nacional vem discutindo o assunto desde 92. O projeto já foi aprovado na comissão do trabalho. Já houve audiência pública da comissão de educação; estamos aguardando o julgamento. A seguir vem a comissão de justiça. O que eu estou sentindo de importante, é que temos o Brasil inteiro se mobilizando e, nossa função, é mostrar à comissão da Educação nossa importância e a necessidade da regulamentação.

Por que vem crescendo a necessidade do psicopedagogo nas instituições e na clínica?

Porque o Psicopedagogo trabalha essencialmente com o fenômeno aprendizagem. Aprendizagem em seu processo maior, num processo educativo na vida, na sociedade, nas relações.

A educação está fragmentada, mas exigindo capacidades integradoras. Aprender a aprender está muito difícil. A aprendizagem está muito difícil. Em uma palestra, em Goiás, Marina Colassante, disse: "O jovem, a criança, precisam desenvolver algumas imagens, fantasias que a vida de hoje não está permitindo". Temos uma realidade no Brasil que vai do menino da "idade da pedra" (o índio e as crianças sem acesso à tecnologia), ou você tem aquele menino que está na Internet 24 h ao dia. Tanto um quanto outro, tomando os dois extremos, precisam da construção de um EU e de uma aprendizagem saudável. Penso que o espaço do psicopedagogo é muito grande, e quando analisamos a possibilidade da regulamentação, é muito em função dessa necessidade de se colocar na melhoria da qualidade de vida do ser humano e do planeta. Um outro fator é o preconceito que existe contra a psicologia ( sou psicóloga e sei disso), o psicopedagogo é mais fácil de ser aceito em alguns lugares, em algumas famílias.

Daí a importância do reconhecimento do psicopedagogo?

Acho que mais importante que a regulamentação, é o psicopedagogo se movimentar para ser reconhecido pela competência. Como acontece com a psicanálise que não é uma profissão legalizada mas é "reconhecida" socialmente. Eu vejo a psicopedagogia necessitando disso, só assim irá se manter num patamar, num status especial. Talvez por dificuldades em se apropriar do lugar. O psicopedagogo precisa se apropriar da sua profissão de forma a ser reconhecida enquanto competência . Esse para mim é o verdadeiro reconhecimento. O reconhecimento oficial é importante mas mais importante que tudo é provarmos a competência do psicopedagogo, sua relevância social, especialmente neste momento histórico que vivemos: mudanças de valores, de paradigmas numa velocidade rápida.

Se o importante é a competência, qual a diferença na questão da regulamentação como especialização e não como graduação?

Porque é necessário que o profissional possua uma formação acadêmica mais sólida e aprofundada para formar-se psicopedagogo assim ele enriquece sua graduação anterior, em qualquer curso de áreas afins por exemplo fonoaudiologia, pedagogia, psicologia. O curso precisa ter um estágio supervisionado, deve ter algumas garantias de qualidade. O reconhecimento garantiria, abrir o espaço de uma forma mais concreta na Rede Pública, em todas as Instituições Públicas do país, garantindo uma ação mais social e democrática.

Qual a diferença da psicopedagogia no Brasil e na Argentina, onde é regulamentada e se estende às áreas hospitalar, empresarial, etc ?

A cultura da psicopedagogia no Brasil está engatinhando quando comparada à Argentina. Acho que as diferenças passam fundamentalmente pela realidade cultural de cada país. A Argentina tem uma história cultural diferente do Brasil. Fiquei uma semana em Los Ninõs, com Ana Maria Muñiz que desenvolve um trabalho comprometido com a seriedade. No Brasil nosso processo histórico foi e é outro, seguimos outro caminho. Os profissionais argentinos, por sua própria história na psicopedagogia, são mais amadurecidos, nós temos profissionais pensando o novo, voltados para as peculiaridades da nossa realidade.

Em que setores estará o psicopedagogo?

Em primeira instância no setor da Educação, em seguida nos hospitais, estatais e empresas. Ele está onde há relações sociais e, portanto, aprendizagem. Está nas instituições , está no aprender humano. Aliás, o psicopedagogo está chegando nas empresas de uma forma muito linda. Se você parar para pensar o movimento que acontece hoje, e está voltado à relação empresa-empregado que vai deixando de ser matriarca protetora. Por tudo que se lê, há a possibilidade a médio prazo da CLT ser modificada no Brasil nessa questão de ser a lei tão paternalista. Nesse momento sobreviverá o profissional mais formado, o mais estruturado, mais competente. Aí, o espaço do psicopedagogo vai se abrir como um botão em rosa. Há algumas experiências, poucas é verdade, mas é um espaço que o psicopedagogo vai saber ocupar nas empresas, sejam estatais ou privadas, atuando nesse novo momento de se aprender a ser empresa e empregado.

E nas escolas, como está o trabalho do psicopedagogo institucional?

Nas escolas particulares o psicopedagogo é uma realidade. Boa parte das boas escolas têm esse profissional nos seus quadros. Se não existe como uma vaga estabelecida em organograma o Orientador ou Coordenador são psicopedagogos e atuam como tal, com olhar e postura de escuta, mediando as aprendizagens em todos os níveis.

E na saúde?

Na saúde também já existem boas experiências. O Hospital das Clínicas está com um setor de psicopedagogia muito bom. Está fazendo um trabalho ligado ao Francisco Assunção, da Psiquiatria Infantil. A Escola Paulista de Medicina também tem gente trabalhando na Santa Casa e em outros Hospitais do Brasil com equipes multidisciplinares.

Você já sabe da existência de psicopedagogos empresariais?

Sim. Sei de colegas que atuam com procedimentos e postura psicopedagógicos junto à área de Recursos Humanos para melhorar a qualidade do aprendizado das pessoas, dos funcionários. Nesse trabalho a atuação está direcionada para o desenvolvimento individual e coletivo do corpo de funcionários. Um funcionário, com suas potencialidades reconhecidas e promovidas, se situa melhor como cidadão de direitos e deveres, portanto mais produtivo para si, para a empresa, para a sociedade e para o planeta. O psicopedagogo, a partir de sua experiência na escola, quer privada ou estatal, observou a necessidade da valorização e desenvolvimento do ser humano, da consideração do custo-benefício como possibilidade e garantia da continuidade de um trabalho. Essa visão era o que as empresas – não escolas, necessitavam. Dá para entender como foi a solicitação de Psicopedagogos nas empresas, não dá?

Em sua opinião, a família e a escola estão confundindo seus papéis? Assistimos a um empurra-empurra de responsabilidades e a criança muitas vezes acaba em um psicólogo ou psicopedagogo sem a efetiva necessidade?

Isso é muito delicado. Na realidade é a família que está perdida, não sabendo lidar com situações novas. Acho que a escola passa a ter uma função mais abrangente, por isso defendo o psicopedagogo institucional. Se você cuidar da psicopedagogia institucional, provavelmente vai ocupar um vazio importante na vida das crianças. Recortemos um exemplo, como o caso de uma criança, que vai a um neuropsiquiatra e vende uma imagem absolutamente oposta à realidade. O neuropsiquiatra pode comprar essa imagem. Isto é um recorte! Já o psicopedagogo que está na clínica, tem que atuar integrando-se com a família e escola, sem competição, mas em parceria para poder trabalhar. Não estamos, aqui, generalizando a atuação de todos profissionas, mas destacando que, pela sua peculiaridade, o trabalho de especialistas pode ser recortado. Já o de Psicopedagogo não o pode, sob pena de não atuar como Psicopedagogo também, é bom afirmar que não estou dizendo que o Psicopedagogo substitui o possível "vazio" que pode haver na relação família-filhos, mas que ele tem a obrigação de atuar nesse espaço, favorecendo a ambos o entendimento do processo que vivem e que, naquele momento, estão podendo desenvolver.

A interface entre a psicopedagogia e a orientação educacional é muito grande, no projeto de regulamentação está previsto algum tipo de aproveitamento, ou integração de atividades?

Sim, porque nosso objeto de trabalho é a aprendizagem e o aprender a aprender eterno, independentemente do contexto histórico e, portanto, metodológico determinante na época.

O que a ABPp está fazendo efetivamente para a regulamentação acontecer?

Há uma comissão organizada com membros da associação, da nacional e das sessões trabalhando nisso. Efetivamente há mais membros de Goiânia e Brasília, pela própria proximidade com Brasília. Todo Projeto de Lei precisa de um deputado. No nosso caso é o deputado Barbosa Neto quem está guiando o projeto. Já houve audiência pública e a síntese do projeto já consta neste site, o Psicopedagogia On Line ( http://www.psicopedagogia.com.br ) e no site da ABPp ( http://www.abpp.com.br ).

Como está a fiscalização de cursos de psicopedagogia, de profissionais?

Como a profissão não é regulamentada a Associação não pode fiscalizar, o que fazemos é organizar os cursos e profissionais através do cadastramento. Um dos objetivos no Congresso de 2000 é um pré-Congresso para os organizadores dos cursos, com a intenção de garantir a boa qualidade de um estágio supervisionado.A ABPp é uma instância catalisadora dos anseios nacionais e, como tal, estará ao lado da categoria, zelando e defendendo a qualidade do seu trabalho.

Uma vez que o curso não está regulamentado, como ficam os profissionais que se intitulam psicopedagogos?

Na verdade a questão é outra. A questão é onde este profissional fez a sua formação? Pois é isso que vai pesar, na minha opinião, sem dúvida sobreviverá no mercado, como em qualquer outra profissão, o profissional mais competente, isso é inegável. A psicopedagogia é uma profissão onde o indivíduo precisa estar muito bem estruturado enquanto EU, caso contrário não terá condições de Ter o necessário olhar abrangente. Então ele tem de cuidar de sua formação, tem de fazer supervisão, não adianta escapar da supervisão,.Assim, a formação de base é que deve ser perguntada detalhadamente, o psicopedagogo tem de cuidar da sua formação. Ele deve cuidar de sua formação completa enquanto profissional ou pessoa, independentemente desta ou daquela linha de atuação.

De uma forma geral, como está o sistema escolar?

Muito aquém do necessário. Neste final da década de 90 ainda encontramos formatos semelhantes aos de algumas décadas atrás. Não está formatado para a criança atual. Se tivéssemos nas escolas psicopedagogos trabalhando essas estruturas, talvez não tivéssemos o número imenso de crianças chegando aos consultórios com problemas de aprendizagem. À medida que as escolas não estão sendo estruturadas para corresponder às necessidades das crianças mais sensíveis, é mais fácil encaminhar. Não é um simples delegar. Na realidade essas escolas não têm condição de atendê-las não estão estruturadas para esse lugar. Permanecem com um formato e o modelo escolar no mundo, obviamente, tem diferenças de lugar para lugar, de década para década. A grande maioria das escolas renovadas na década de 70, não conseguiu sustentar as mudanças. De uma certa maneira tentaram renovar o modelo, mas não modificaram o estrutural. Houve escolas que se perderam na orientação porque esqueceram que a criança precisa ser organizada, precisa ser cuidada dentro daquilo que tem. Vieram com idéias muito boas, com conceitos acadêmicos de primeira grandeza, mas deixaram de adequar a instituição. Podemos dizer que deixaram de se fundamentar , de se atualizar, de viver constextualizandas com o momento histórico que vivemos. Se o olhar psicopedagógico existisse nas escolas, a clínica seria reduzida. A falta de uma estrutura psicopedagógica gera muito problema escolar. Uma escola bem estruturada pode resolver muitos problemas. Ao analisarmos dois níveis de psicopedagogos, o clínico e escolar, deveria ir para o clínico aquela criança que efetivamente apresenta um problema clínico. Mas, as escolas confundem muito, mandando para os clínicos crianças que uma boa estrutura escolar resolveria. A atuação do psicopedagogo amenizaria.

Quais seriam os problemas clínicos, ou indicação para uma escola especial?

Essa é uma pergunta muito ampla. Um caso clínico seria daquela criança que tem alguma etiologia neurológica, alguma questão fisiológica, ou que, ao longo de sua história, adquiriu algum problema que dificulta sua relação dela com a aprendizagem, machucada pelo sistema. Um caso de cuidado especial seria o daquela criança mais desatenciosa. A criança mais inteligente que é tachada como problema.

Os psicopedagogos estão também nas escolas especiais?

Uma escola especial, tem de estar na mão de um psicopedagogo.

Presidente, para finalizar, como será o Congresso de Psicopedagogia de 2000?

Estamos preparando um Congresso comprometido com as demandas e anseios da contemporaneidade, que possa fortalecer a psicopedagogia no Brasil como um todo, que seja multiplicador, fortalecedor. O psicopedagogo também precisa saber o seu lugar. A escola não é lugar para se fazer clínica, na escola se faz Psicopedagogia Institucional. Infelizmente, vemos alguns profissionais fazendo clínica dentro da escola, isso não dá certo porque não é ali esse espaço.

Nívea Maria C. de Fabrício - Presidente da ABPp - Associação Brasileira de Psicopedagogia. Psicóloga com formação em Psicanálise, Psicopedagoga, Terapeuta Familiar, Formação em Psicopedagogia em Epsiba e no grupo de Psicopedagogos da prof. Alicia Fernández, especialista em Psicoprofilaxia pelo Sedes Sapintiae.

Caras colegas, leiam e releiam atentamente esse artigo e deflitam suas práticas. E sucesso para nós todos!

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